domingo, dezembro 05, 2004

AZULICES (Curiosidades açoreanas) VII I- Patrícia e P. Nuno


Posted by Hello

A Patrícia (alentejana) vive no Faial com o Paulo Nuno (faialense).
São dois amigos que fiz na Horta.

sábado, dezembro 04, 2004

ARTE DE TRANSFORMAR XI

Alarga os teus horizontes

Por que é que combateis? Dir-se-á, ao ver-vos,
Que o Universo acaba aonde chegam
Os muros da cidade, e nem há vida
Além da órbita onde as vossas giram,
E além do Fórum já não há mais mundo!

Tal é o vosso ardor! tão cegos tendes
Os olhos de mirar a própria sombra,
Que dir-se-á, vendo a força, as energias
Da vossa vida toda, acumuladas
Sobre um só ponto, e a ânsia, o ardente vórtice,
Com que girais em torno de vós mesmos,
Que limitais a terra à vossa sombra...
Ou que a sombra vos torna a terra toda!

(...)

Dir-se-á que o mar da vida é gota d'água
Escassa, que nas mãos vos há caído,
De avara nuvem que fugiu, largando-a...
Tamanho é o ódio com que a uns e a outros
A disputais, temendo que não chegue!

Homens! para quem passa, arrebatado
Na corrente da vida, nessas águas
Sem limites, sem fundo - há mais perigo
De se afogar, que de morrer à sede!
De que vale disputar o espaço estreito,
Que cobre a sombra da árvore da pátria,
Quando são vossos cinco continentes?
De que vale apinhar-se junto à fonte
Que - fininha - brotou por entre as urzes,
Quando há sete mil ondas por cada homem?

(...)

De que vale concentrar-se a vida toda
Numa paixão apenas, quando o peito
É tão rico, que basta dar-lhe um toque
Por que brotem, aos mil, os sentimentos?!
Oh! a vida é um abismo! mas fecundo!
Mas imenso! tem luz - e luz que cegue.
Inda a águia de Patmos - e tem sombras
E tem negrumes, como o antigo Caos:
Tem harmonias, que parecem sonhos
De algum anjo dormido; e tem horrores
Que os nem sonha o delírio!

É imensa a vida,
Homens! não disputeis um raio escasso
Que vem daquele sol; a ténue nota,
Que vos chega daquelas harmonias;
a penumbra, que escapa àquelas sombras;
O tremor, que vos vem desses horrores.
Sol e sombras, horror e harmonias
De quem é isto, se não é do homem?!

Não disputeis, curvado o corpo todo,
As migalhas da mesa do banquete:
Erguei-vos! e tomai lugar á mesa...
Que há lugar no banquete para todos:
Que a vida não é átomo tenuíssimo,
Que um feliz apanhou, no ar, voando,
E guardou para si, e os outros, pobres,
Deserdados, invejam - é o ar todo,
Que respiramos; e esse, inda mais livre,
Que nos respira a alma - a terra firma.
Onde pomos os pés, e o céu profundo
Aonde o olhar erguemos - é o imenso,
Que se infiltra do átomo ao colosso;
Que se ocultou aqui, e além se mostra;
Que traz a luz dourada, e leva a treva;
Que dá raiva às paixões, e unge os seios
Com o bálsamo do amor; que ao vício, ao crime,
Agita, impele, anima, e que à virtude
Lá dá consolações - que beija as frontes
De povo e rei, de nobre e de mendigo;
E embala a flor, e eleva as grandes vagas;
Que tem lugar no seio, para todos;
Que está no rir, e está também nas lágrimas,
E está na bacanal como na prece!...

Antero de Quental

quinta-feira, dezembro 02, 2004

* Vermelhices (Comentários políticos) V*

A "Quinta das Celebridades" e a liberdade de expressão

É curioso, para não dizer decepcionante, verificar como a Comunicação Social Dominante (CSD), isto é; a Comunicação Social ao serviço do grande capital e, logo, da ideologia dominante (e desculpem lá os que acham que os termos são ultrapassados e demasiado conotados, mas a verdade é que ainda não foram inventadas palavras mais adequadas. E era bom que as almas mais susceptíveis reflectissem se não será a verdade, e não as palavras, que os apoquenta), subverte os factos arranjando interpretações mirabolantes sobre os acontecimentos.
Li num texto sobre teoria da comunicação, da autoria de um sujeito chamado Paul Beaud, que os noticiários televisivos deixaram de o ser. Bom, as palavras não eram bem estas, mas o sentido era. Ele dizia, em 1997!!, que o lúdico tinha substituído o puramente informativo e assim, seguindo uma velha conclusão, já tirada por Antero de Quental - "(...) não lendo ninguém senão o que lhe agrada, o público nunca favorecerá senão o que estiver à sua altura, e por isso o jornal, para durar, será sempre e necessariamente o espelho lisonjeiro do público e não o seu mestre severo. Os jornais só vivem fazendo-se os confidentes de comédia do público, das suas paixões, dos seus erros, das suas ilusões e não os seus apóstolos” -, os "grandes" media optam, em nome do dinheiro, por alimentar as ilusões de um povo que vive profundamente frustrado. Um povo ao qual patrões e governantes cinicamente pedem sacrifícios em prol de uma retoma que não vem (assim como antigamente se dava o castigo na vida em troca do paraíso na morte), ao qual é inflingida a doença, o desemprego, a miséria. E não se trata de um exagero! duzentos mil portugueses, duzentos mil!! vivem abaixo do limiar de pobreza. Não são os pobres! São os miseráveis!! duzentos mil!! Pobres serão muitos mais. Um povo a cujo magro salário se retira cerca de 20%, supostamente, para gerir e construir o país. Mas ao qual se cobram, e se apresentam como lógicas, cada vez mais elevadas taxas pela saúde, pela justiça, pela educação, pela habitação, portagens em quase todas as vias, valores elevadíssimos para a fruição cultural, etc., etc., etc. Um povo ao qual, impunes líderes partidários que reclamam maiorias absolutas em nome de teóricas estabilidades governativas, retiram a estabilidade de vida e a possibilidade de jovens poderem fixar uma casa, uma família, amigos, tudo! porque lhes ofereçem precariedade laboral embrulhada num lindo papel a que chamaram produtividade e com um laçarote baptizado de flexibilidade. Mas a esse mesmo povo mostram os media que ele só será feliz se tiver o carro x, se cheirar a y, se se vestir como z, se tiver o telemóvel w, se pagar a tempo e horas o telefone, a electricidade, o gás, se ouvir as músicas e ver os filmes que vêm empacotados dos Estados Unidos. A esse povo dizem que tudo o que se opõe a esta "belíssima" ordem é terrorista, uma aberração ou está ultrapassado.
Então, esse povo, deleita-se com telenovelas e futebol, e deleita-se com o cúmulo do culto da estupidez; um programa chamado "Quinta das Celebridades"; e com notíciários que não informam porque fornecem dados perfeitamente irrelevantes para um conhecimento alargado e aprofundado da realidade. Notíciários que repetindo um acontecimento até à exaustão e de forma promenorizada, deixam de parte outros acontecimentos e assuntos importantes, notíciários que contam apenas uma versão dos factos, ou pior, que, de forma desonesta, tentam mostrar a imparcialidade que não têm.
A liberdade de informação e de expressão não foi posta em causa porque Marcelo Rebelo de Sousa foi afastado da TVI. Ou porque José Rodrigues dos Santos se demitiu por causa de um concurso para selecção de um correspondente da RTP. A liberdade de expressão acabou no dia em que deixou de existir o direito à informação. Ela ainda existe no papel, é certo, mas também o direito à dignidade está celebrado na lei e eu olho para o lado e vejo cada vez mais gente que a perdeu.A liberdade de expressão não é uma coisa acrítica. Ela existe no quadro de uma democracia, inventada há quase trinta e um anos. Somos livres de dizer, como diz a canção, mas somos livres de poder dizer alto e de poder dizer o que sabemos e pensamos. E para sabermos e pensarmos temos de estar informados e apetrechados com o mais vasto conhecimento.
O povo vive frustrado. No dilema entre aquilo que sente e aquilo que lhe dizem que deve sentir. Entre querer ser livre e querer corresponder à imagem de sucesso que lhe impingem. Entre ouvir dizer que se pode expressar e poder efectivamente expressar-se. Entre querer ser humano e ter que corresponder à máquina que o patrão quer que ele seja. O povo já não sabe se o que está certo é a dor que lhe dilacera o peito ou a vergonha de não ser feliz - "Que força é essa amigo que te põe de bem com os outros e de mal contigo" cantou o Sérgio Godinho - .
A CSD, a propósito da dissolução da Assembleia da República e consequente queda do Governo, ao apontar as causas para o sucedido, pela voz de jornalistas e comentadores, não foi capaz, não quiz, não se atreveu, não deu importância, aos últimos anos de vida deste povo. Sampaio teria chamado Santana Lopes apenas por causa da crise interna no Governo. A história tem sido contada como se fosse o "Big Brother" ou a "Quinta das Celebridades": tudo não passa de um grande conflito que se deu entre os membros que compõem o Conselho de Ministros. Todos, ou quase todos, falam em abstracto: da crise, da estabilidade, da legitimidade, de quem vem, de quem foi. Tudo com muita opinião: a de Durão Barroso na Bélgica, a de Guterres nos EUA, de Paulo Portas (com a sua cara de pau) no Largo do Caldas, de Sampaio algures em visita caritária, de Sócrates no Largo do Rato, de João Soares ao telefone, Louçã na Assembleia da República, de Rui Rio numa reunião do PSD, de Manuel Monteiro não sei de onde, e a destoar, em 10 segundos (num total de 5 horas), Jerónimo de Sousa a lembrar, e bem, que, de futuro não podemos ter mais do memo. Imagens de Ferro Rodrigues em declarações de há quatro meses, de Santana e Cavaco em arrufos de namorados em diversos episódios. Só faltava mesmo fazerem um teledisco. Sobre as verdadeiras causas da queda do Governo? Nada!!!
A verdade é que o Governo cai porque, apesar de tanta demagogia, tanta manipulação, tanta mentira, o povo já não sustentava este governo. Quantos portugueses ficaram tristes?quantos portugueses se reconheciam neste governo? quantos achavam que este era o caminho certo para o país? A verdade é que, apesar de brando, o povo português deitou abaixo o Governo. Ou alguém realmente acredita que se as pessoas andassem satisfeitas com a política do PSD-PP o Governo ia abaixo? se o povo sentisse que, de algum modo, este era o seu governo, teria havido esta "Quinta das Celebridades"?
E a liberdade de expressão só poderá existir quando a CSD nos disser esta e outras verdades.