*Vermelhices (Comentários Políticos) XV* - 8 dias para a Revolução
LEGITIMIDADE REVOLUCIONÁRIA
"Quando derrubada a ditadura, se dera, para além da acção militar dos «capitães» no dia 25, o levantamento militar e o levantamento popular de massas, quem detinha a legitimidade revolucionária? O Presidente do órgão supremo do poder político-militar (a JSN), que decidia e tomava medidas práticas e procurava impor ao povo a continuação da PIDE/DGS, e não queria libertar todos os presos políticos, ou as massas populares e militares revolucionários, que assaltaram as sedes da PIDE, prenderam os pides, ocuparam as instalações, cercaram as prisões e impuseram a libertação dos presos políticos?
Quem detinha a legitimidade revolucionária? O mesmo Presidente da JSN que, citando um artigo (que conseguira impor) do Programa do MFA, pretendia negar a imediata legalidade do PCP (que tinha combatido como nenhum outro a ditadura e lutado pela liberdade) ou o PCP que lhe respondeu que a liberdade tinha sido conquistada, que o PCP não aceitava tal proibição e que já estava a actuar livremente no Portugal libertado da ditadura fascista?
Quem detinha a legitimidade revolucionária? O mesmo Presidente da JSN, que pretendia no imediato por termo ao saneamento de fascistas e impor, a seu mando, uma hierarquia militar contrária à revolução, ou a Comissão Coordenadora do Programa do MFA, reconhecida então pelos "capitães" e pelo MFA, como organismo político-militar do MFA?
Quem detinha a legitimidade revolucionária? Aqueles que defendiam os banqueiros e outros senhores dos grands grupos económicos, na tentativa desenvolvida desde os primeiros dias da revolução de afogar económica e financeiramente a nascente democracia, retiravam e transferiam ilegalmente capitais, anulavam encomendas, paralisavam a produção, ou os trabalhadores, que começaram a vigiar, a denunciar, a contrariar e a controlar e em alguns casos a impedir tais actuações?
Quem detinha a legitimidade revolucionária? Os que protegiam os grandes agrários, que deitavam fogo às searas e levavam de contrabando o gado para Espanha, ou os trabalhadores, que retinham o gado, ocupavam as terras incultas e começavam a cultivá-las?
A liberdade e a democracia não foram concedidas por ninguém, por nenhum órgão de poder. Foram conquistadas pela luta dos trabalhadores, das massas populares, dos militares progressistas, num processo revolucionário, cuja dinâmica própria, com todas as suas contradições e conflitos internos, determinou as características fundamentais da democracia portuguesa conquistada com a revolução, através de transformações e reformas profundas na sociedade portuguesa."
Álvaro Cunhal
in A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril
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