domingo, fevereiro 27, 2005

ARTE DE TRANSFORMAR XXIV

estátua de José Afonso
na Amadora
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Coro da Primavera

Ergue-te canalha
Na mortalha
Hoje o rei vai nu.

Os velhos tiranos
De há mil anos
Morrem como tu.

Abre uma trincheira
Companheira
Deita-te no chão.

Sempre á tua frente
Viste gente
Doutra condição.

Ergue-te ao sol de verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção

Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já tambores

Livra-te do medo
Que bem cedo
Há-de o sol queimar

E tu camarada
Põe-te em guarda
Que te vão matar

Venham lavradeiras
Mondadeiras
Deste campo em flor.

Venham enlaçadas
De mãos dadas
Semear o amor.

Ergue-te ao sol de verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção

Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já tambores

Venha a maré cheia
Duma ideia
P’ra nos empurrar.

Só um pensamento
No momento
P’ra nos despertar.

Eia mais um braço
E outro braço
Nos conduz irmão.

Sempre a nossa fome
Nos consome
Dá-me a tua mão.

Ergue-te ao sol de verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores

Ouvem-se já tambores

José Afonso

ARTE DE TRANSFORMAR XXIII

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Homenagens a José Afonso

Apesar de ir com alguns dias de atraso, fica aqui a minha HOMENAGEM àquele que considero o maior génio da música portuguesa.

Este é um texto apenas sobre as HOMENAGENS póstumas que lhe foram feitas. Não quis fazer mais uma biografia, a minha ideia é apenas mostrar que o esquecimento do Zeca faz parte do pacote de branqueamento do 25 de Abril. E pretendo mostrá-lo lembrando algumas das muitíssimas HOMENAGENS que foram feitas nos dois anos que se seguiram ao seu desaparecimento. Cito também algumas mais recentes (poucas, muito poucas).

Em 1982 foi-lhe diagnosticada uma esclerose lateral amiotrópica

As despesas com a saúde eram avultadíssimas. O Estado não soube ou não quis apoiar o cantor (os governos PS, CDS e PSD, alvos das suas críticas, não tiveram, provavelmente, a coragem de olhá-lo como um precioso artista. A recusa da Ordem da Liberdade também o deixou em “maus lençóis” com a presidência).

Morreu a 23 de Fevereiro de 1987. O seu caixão, a seu pedido, foi coberto de uma bandeira vermelha sem qualquer insígnia.


O seu funeral realizado em Setúbal em 24 Fevereiro de 1987, contou com a presença de dezenas de milhar de pessoas. A sua morte foi profundamente sentida e toda a imprensa a noticiou. Alguns depoimentos são demonstrativos do sentimento de perda e reconhecimento que se instalou:
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Amália Rodrigues – “Acho que se perdeu um grande poeta e um grande autor da música popular portuguesa”;
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Bernardo Santareno – “A arte de José Afonso é um jorro de água clara, puríssima, portuguesa sem mácula”;
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Camilo Mortágua – “Portugal é o Zeca. Não a pessoa do Zeca mas todo o mundo que ele representa”;
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Carlos do Carmo – “O Zeca é uma pessoa para continuar a ser vivida”;
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Carlos Paredes – “Uma figura universal”;
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Fausto – “Ele é, para mim, a grande referência, quer como compositor e cantor, quer quanto a comportamento e atitudes”;
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Isabel do Carmo – “Ele era os olhos do país”;
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Janita Salomé – “Com a morte do Zeca perdi um bocado de mim próprio”;
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José Cardoso Pires – “Vamos continuar a ouvi-lo, para estarmos vivos e prosseguir”;
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José Jorge Letria – “Uma humildade que chegava a doer de tão autêntica”;
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José Mário Branco – “O Zeca é um génio da música portuguesa”;
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Luís Represas – “A vida dele constitui, ela própria um depoimento – o melhor depoimento”;
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Otelo Saraiva de Carvalho – “Sinto a morte do Zeca como a de um irmão querido”;
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Rui Pato – “Depois da morte de Adriano Correia de Oliveira e de José Afonso sinto-me órfão”;
-
Sérgio Godinho – “Nem tu sabes o que nos deixaste”.

E um produzido por conveniência: “É uma perda para a cultura portuguesa” disse Mário Soares.

O jornal Sete dedicou, durante cerca de duas semanas, grande parte das suas páginas à figura de José Afonso, entre estas constavam depoimentos de inúmeros leitores e um deles refere-se precisamente ao que disse Mário Soares: “(...) faria o dr. Mário Soares um grande favor se o esquecesse. E esses senhores que nunca lhe ligaram a mínima importância, a não ser para o olharem de revés, agora não podem dar por especial favor uma rua com o seu nome, a um Homem de quem foram todas as ruas. O Zeca nunca teria o pretenciosismo de querer tal coisa porque foi acima de tudo um simples”[1]. No mesmo jornal, a 25 de Fevereiro de 1987, Amália Rodrigues, António Pinto Vargas, A Emi–Valentim de Carvalho, Janita Salomé, Jorge Palma, Pedro Caldeira Cabral, Rádio Macau, Rui Veloso, os Trovante e Vitorino fazem publicar uma página inteira em que consta apenas: “A música portuguesa não vai esquecer José Afonso”.

Outros órgãos de comunicação social fizeram grande cobertura do acontecimento: El País publicou duas páginas a 1 de Março de 1987; a rádio Globo no Rio de Janeiro, dedicou uma boa parte da sua emissão de 23 de Fevereiro a José Afonso, vários protagonistas da música popular brasileira participaram no programa, Nara Leão cantou pelo telefone, integralmente, “Grândola, vila morena”, na Galiza, em vários jornais publicaram-se notas e artigos sobre o assunto.

Também as associações de estudantes quiseram assinalar o lamento pela perda. A Associação de Estudantes da Faculdade de Letras de Lisboa foi particularmente dinâmica, logo em Março, numa Reunião Geral de Alunos aprovou uma moção de homenagem, e em Dezembro desse ano, com outras associações promoveu um grande espectáculo na Aula Magna. Mas também a Associação Académica de Coimbra se juntou às manifestações de apreço e disponibilizou para o funeral dois autocarros aos estudantes que quiseram ir a Setúbal. No Diário de Notícias, em 25 de Fevereiro de 1987, criticava-se, no entanto, o esquecimento a que José Afonso ficou votado pela sua academia durante muito tempo. Mais tarde a “república” do “Rás-te-parta”, por onde o cantor também passou, promove-lhe uma singela homenagem, e em 1989, no teatro Gil Vicente em Coimbra a Associação Académica apresentou um espectáculo mais elaborado.

Os estudantes do ensino secundário também demonstraram a sua estima através de iniciativas, foi o caso das Escolas D. Duarte de Coimbra em Fevereiro e da Secundária D. Luísa de Gusmão em Março de 1988.

Por parte das autarquias as homenagens mais importantes fizeram-se nos distritos de Lisboa e Setúbal. No Barreiro, a 25 de Fevereiro, na sessão de Câmara fez-se um minuto de silêncio, atribuiu-se o seu nome a uma rua, fez-se a exigência à rádio e RTP para não o calarem, e fez-se a proposta para que todas as câmaras do distrito editassem um disco[2].

A Câmara Municipal de Sesimbra atribuiu igualmente, em Maio de 1988, o seu nome a uma rua. A Câmara de Loures apoiou a edição de uma fanzine sobre o cantor, a Câmara Municipal do Seixal deu o seu nome a um parque e passou a promover anualmente o festival “Cantigas do Maio” conjuntamente com a Associação José Afonso que, entretanto, se criara (Novembro de 1987). Associação essa que acolheu como sócios muitos dos membros do Círculo Cultural de Setúbal de que José Afonso fizera parte e que também não deixou de o homenagear em 1988. A Câmara Municipal da Amadora, por seu turno, ergueu-lhe uma estátua que se encontra no parque central da cidade e um painel de azulejos alusivo à sua música, criou o prémio José Afonso, que ainda hoje se atribui, e que constitui uma distinção importante no seio dos músicos portugueses. É anualmente entregue no festival de música popular portuguesa que a mesma autarquia promove.

O movimento associativo de base local, nomeadamente associações culturais e colectividades, foram prestando, de algum modo, durante os primeiros dez anos após a sua morte, singelas homenagens um pouco por todo o país ao longo da faixa litoral e nos Açores. Das Beiras interiores (Alta e Baixa) não há registo.

Os sindicatos também celebrizaram José Afonso e é de apontar, em particular, a União dos Sindicatos de Setúbal que, no primeiro aniversário da sua morte, apelou para que os trabalhadores fizessem um minuto de silêncio e fossem depositar flores na sua campa. Na empresa Mague – Setúbal, cujos trabalhadores quiseram seguir o repto, a administração não permitiu que à hora de almoço, no refeitório, se transmitissem músicas de José Afonso e só permitiu o minuto de silêncio às 11h59, i.e., um minuto antes de tocar para o almoço.

No mundo da música, naturalmente, as homenagens foram de maior relevo: Charlie Haden (músico de jazz) e a sua Liberation Music Orchestra, em 1989, tocou “Grândola, vila morena”; em 1994 diversos grupos de música e cantores portugueses gravam o disco Filhos da madrugada, interpretando canções de José Afonso; e no mesmo ano 1994, Amélia Muge, João Afonso e José Mário Branco desenvolveram o projecto musical Maio, maduro Maio, pelo qual foi editado um disco também com interpretações do repertório de José Afonso e uma música original em sua homenagem; entretanto muitos outros músicos adoptariam temas de José Afonso que interpretariam, infelizmente, nem sempre referindo a autoria.

Um outro sector procurou manter viva a memória do cantor foi o dos professores, por via sindical, da Fenprof (em 1987 e 1989) e na formação de professores, como foi o caso da Escola Superior de Educação de Setúbal que o homenageou, em 1988, salientanto o seu papel como professor.

Também nesse sentido, a DREL deu o seu nome a uma escola secundária de Loures.

Finalmente, em 1997 (no 10º aniversário da sua morte), a RTP decidiu recordá-lo passando uma parte do concerto do Coliseu de 1983, durante o Festival da Canção, o que provocou a reacção por parte da Associação José Afonso e da viúva Zélia Afonso que lembraram; a animosidade que o cantor sentia por esse evento, lembrando inclusive a sua participação no Contra-Festival da Canção, o facto de o concerto não ter sido transmitido integralmente e de a viúva ter sido convidada por telefone por uma relações-públicas da empresa.

Em torno dos vinte anos do 25 de Abril desenvolveram-se comemorações em que o seu nome foi frequentemente evocado. Mas o mais importante foi a publicação do livro de José António Salvador, O rosto da Utopia, com o apoio da Associação 25 de Abril e da Câmara Municipal de Lisboa.

Mais recentemente, no âmbito da Expo 98, foi-lhe prestada uma homenagem, sob projecto de Adelino Gomes, “sóbria e discreta através do melhor que Zeca Afonso tem: a sua obra poética”[3], que constava na projecção de poemas do cantor, na parede do Pavilhão do Conhecimento, nos últimos quatro dias do evento. Ainda no âmbito da Exposição Universal foram publicados seis discos de Grandes intérpretes, um tema seu estava incluído, por outro lado, músicos como Isabel Silvestre, Filipa Pais, Sérgio Godinho, Janita Salomé e Amélia Muge que actuaram nos palcos da exposição, fizeram questão de lembrar José Afonso cantando-o.

Na revista do quarto Festival da Música Popular Portuguesa, em 1991, Júlio Pereira escreveu o seguinte:

Sempre que assistíamos a um concerto de música erudita, não importa agora de que tipo, Zeca mostrava-me sempre a verdade. Ele sentia, de facto, e por ficar fascinado perante uma outra música da qual era admirador, uma espécie de sensação de frustração, até de inferioridade, do género: «o que é a minha música ao pé de uma música tão grande?». É evidente que eu não tinha resposta. Qualquer resposta era absurda: «não se podem fazer comparações» ou «o popular e o erudito são uma complementaridade». Absurdas, porque o Zeca sabia muito bem tudo isso. Absurdas sim, porque aquele momento é verdadeiro. Porque o fascínio não passava levianamente pela nossa dimensão. O que a Arte nos provoca é isso mesmo: a noção do nosso exacto tamanho. A música não engana ninguém, muito menos um músico. A música é que não deixa um músico mentir. (...)

Falo-te em abstracto de coisas concretas. Falo-te da melhor escola de música ou de outra coisa qualquer. Falo-te de experiências reais, vividas, comuns a todos nós. (...) Falo ainda de tudo o que nasce, ou do que nasce em nós quando nos encontramos perante um outro músico que admiramos. Nesse preciso momento somos pequenos. (...)

Muitas das coisas da vida estão mesmo ao nosso lado. E acredito que muito boa gente ao longo da sua existência, não se tenha apercebido dessa proximidade. É sempre mais fácil esperar o que já se sabe ser, do que o que não se sabe o que é. Venha da Natureza, venha do ser humano. Venha, ainda, da própria música. E que esperas tu da vida, músico? (...)

Tens aí um gravador? Sabe-se lá como, daquela boca saia uma melodia espantosa! E eu, eterno curioso, levava-a comigo e tentava harmonizá-la. (...) Feliz e contente ia ter com ele mostrar-lhe o resultado. O inesperado era inevitável. O Zeca ouvia... – “Mas não é bem isso...” – “Esta canção é uma história” – “Deverá ter uma atmosfera própria”. – “Estás a ver uma fogueira, com pessoas à volta tendo à roda dos tornezelos uns guizos?” (...)

«Quem canta por conta sua, canta sempre com razão».

Percebes colega músico, a verdade irónica desta frase? Os teu ídolos, aqueles que admiras, aqueles sem os quais não passas, os que te põem os pelinhos do braço eriçados, têm na realidade, razão. Toda. Por isso mesmo, sempre que me tocares por conta tua, se és mesmo músico, acompanhar-te-ei sempre que o desejares. É talvez a única matéria que não precisa de escola para ser aprendida. E é desta matéria que se faz a música.

(...)

E tu, outro músico, que julgas que já ouviste o suficiente, quando tocares Zeca, não vás pela facilidade. Deixa-me sentir o Zeca quando tocas. Não o subestimes com esse ritmo «chapa 5», ou essa harmonia complexada cheia de 13ª monopolizando o arranjo. Essa música é uma história. É preciso encontrar a atmosfera própria... Lembraste do que o Zeca dizia?.

Periódicos
Do arquivo da Associação José Afonso, pasta “Homenagens estrangeiras”
- A Nossa Terra, s.d.
-
Jornal de Notícias, s.d.
-
Nossa Terra, 1 de Agosto de 1985
-
Sete Artes, 23 de Agosto de 1985
-
O diário, 24 de Agosto de 1985
-
El País, 27 de Agosto de 1985
-
La voz de Galicia, 28 de Agosto de 1985
-
La voz de Galicia, 29 de Agosto de 1985
-
O jornal, 30 de Agosto de 1985
-
La voz de Galicia, 30 de Agosto de 1985
-
La voz de Galicia, 2 de Setembro de 1985
-
El País, 3 de Setembro de 1985
-
Eligeme. S.d.
-
Sete, 18 de Fevereiro de 1987
-
A Nossa Terra, 26 de Fevereiro de 1987
-
Iñaki Zanata, “La amarga lucidez de José Afonso”, Diario Vasco, 27 de Fevereiro de 1987
-
Faro de Vigo, 11 de Abril de 1987

Do arquivo da Associação José Afonso, pasta “Homenagens nacionais”
- Boletim Municipal do Barreiro, Abril de 1984
-
Viriato Teles e Joaquim Bizarro, Sete, 2 de Maio de 1984
-
Diário de Notícias, 25 de Fevereiro de 1987
-
Sete, 25 de Fevereiro de 1987
-
Izequiel Lino, “Quando quero chorar não posso”, Boletim Municipal de Sesimbra, Fevereiro de 1987
-
Boletim Municipal do Barreiro, Março de 1987
-
Luísa Campos, Sete, 11 de Março de 1987
-
AAVV (Rádio Imprevisto), Zeca Afonso (fanzine), Maio de 1987
-
Boletim Municipal do Seixal, Julho de 1987
-
Sete, 1 de Dezembro de 1987
-
“Estudantes lembram José Afonso”, Jornal de Letras, 6 de Dezembro de 1987
-
(Cooperativa de Animação Cultural de Alhos Vedros), Zeca dois anos depois”, O Esteiro, s.d.
-
Barcelos Popular, 12 de Fevereiro de 1988
-
José Jorge Letria, “Zeca: rigor e partilha”, Fim-de-Semana, 20 de Fevereiro de 1988
-
“Associação José Afonso – Pela divulgação da obra, contra o esquecimento”, Diário de Lisboa, 23 de Fevereiro de 1988
-
José António Salvador, “José Afonso: ano zero”, 23 de Fevereiro de 1988
-
“«anónimos» cantam a «Grândola»”, Diário de Lisboa, 24 de Feveriro de 1988
-
Correio do Minho, 25 de Fevereiro de 1988
-
Diário de Lisboa, 25 de Fevereiro de 1988
-
“Zeca Afonso proibido no refeitório da Mague-2”, Diário, 25 de Fevereiro de 1988
-
Jorge Martins, Gira Loures, Fevereiro de 1988
-
(Centro de Cultura Libertária – Almada), Antítese, nº8, Fevereiro a Abril de 1988
-
Nuno Gomes dos Santos, “Com jovens como estes «eles» nunca mais comem tudo”, Diário, 12 de Março de 1988
-
Maré Viva, 17 de Março de 1988
-
Boletim Agrícola, s.d. (1988)
-
Boletim Municipal de Sesimbra, Maio de 1988
-
O povo de Guimarães, 18 de Novembro de 1988
-
Diário do Açores, 22 de Fevereiro de 1989
-
“Zeca Afonso dois anos depois”, Maré Viva, 2 de Março de 1989
-
“Homenagem municipal ao cantor da liberdade”, Boletim da Câmara Municipal da Amadora, 8 de Março de 1989
-
“Professores homenageiam Lindley Cintra e Zé Afonso”, O diário, 10 de Maio de 1989
-
“«Grândola», versão Charlie Haden”, Jornal de Letras, 25 de Julho de 1989
-
Boletim Municipal do Seixal, Setembro de 1991
-
José Fontão, Referencial, Julho/Setembro de 1995

Do arquivo da Associação José Afonso, pasta “O rosto da utopia”
- “José Afonso... Inquietação devoradora”, Público, 16 de Julho de 1994
-
“Zeca Afonso voleibolista”, A Bola, 17 de Julho de 1994
-
O Independente, 5 de Agosto de 1994
-
Diário de Notícias, 3 de Abril de 1999
-
Diário de Notícias, 4 de Abril de 1999
-
Diário de Notícias, 1 de Maio de 1999
-
Público, 24 de Maio de 1999
-
Jorge P. Pires, “A canção como arma”, Expresso (Cartaz), 7 de Agosto de 1999

Do arquivo da Associação José Afonso, pasta “Expo’98”
- Diário de Notícias, 6 de Agosto de 1998
-
Maria do Céu Lopes, “Mais amigos para Zeca Afonso”, Público, 27 de Setembro de 1998
-
Diário de Notícias, 15 de Agosto de 1998
-
Diário de Notícias, 25 de Agosto de 1998

Do arquivo da Associação José Afonso, pasta “2002”
-
João Manuel Tavares, “O génio abandonado”, Diário de Notícias, 23 de Fevereiro de 2002

Fontes impressas
Do arquivo da Associação José Afonso, pastas “Homenagens estrangeiras” e “Homenagens nacionais”
- Folheto do Centro Cultural do Altominho, “Homenagem a José Afonso – 25 de Fevereiro de 1985”
-
Carta da Associação Cultural de Vigo, 31 de Agosto de 1985
-
Folheto-postal, “Café Uf – Homenaxe José Afonso”, (Abril 87)
-
Talão-recibo de “Bonoaxuda”, “Enquanto há força – Homenaxe a José Afonso – Galicia, (Maio 87)
-
Folheto do Centro Cultural José Afonso, “«Negra sombra blues», Café Placer, 19 Vigo”, (13 de Julho de 1987)
-
Folheto da Associação Cultural de Vigo, “Xornada adicada ao Zeca Afonso – Audicion, Video, Debate – 23/08/87”
-
Cartaz e folheto da Escola Secundária Gil Eanes – Lagos, “Homenagem a José Afonso”, (Fevereiro de 1988)
-
Folheto, “José Afonso – vida e música – serão na biblioteca da Nazaré – 26/2/88”
-
Folheto da Escola Superior de Educação de Setúbal, “Literatura e língua portuguesa - Folhas de Fevereiro – José Afonso”, (1988)
-
Cartaz e folheto da D.G. da Associação Académica de Coimbra, “Homenagem a José Afonso – Teatro Académico Gil Vicente – 12/2/1989”
-
Carta do Núcleo de S. Miguel da Associação 25 de Abril, Março de 1989
-
Folheto, “Macau - Homenagem a José Afonso – 23 de Fevereiro de 1992”
-
Brochura, “Uma noite recordado José Afonso – Salão nobre da Junta de Freguesia de S. Mamede Infesta – 19 de Fevereiro de 1994”
-
Folheto do Clube Recreativo Barroquense, “16º aniversário – Exposição e colóquio «Recordar José Afonso» -Barrocas, 30/9/1998)
-
Folheto do “Ayuntamiento de Madrid”,“Ciclo musical – «recordando la vida y la obra de José Afonso – una homenaje al cantante português próximo el 25 de Abril”


[1] - Luísa Campos no Sete, 11/3/1987
[2] Boletim Municipal do Barreiro, Fevereiro 87
[3]
Público, 27/9/1998

Será que alguém tem paciência para a minha verborreia intelectual?

O que são homenagens?

A condição humana é, entre outros aspectos, a do dilema ou contradição, da consciência de uma vivência limitada a uma singularidade, isolamento e efemeridade e a ambição à omnisciência e à omnipresença. A nossa racionalidade permite-nos estabelecer laços de comunicação inteligíveis, que alargam o nosso campo de acção, e logo geram a ambição e contribuem para a sua satisfação, mas paradoxalmente é a nossa liberdade individual que nos limita, pois a sua vastidão funciona como engodo ou tentação. A liberdade em si não concede sentido à nossa existência, i.e., não transforma a nossa vida fugaz numa realização plena. São as escolhas que fazemos no uso dessa liberdade que nos asseguram um entendimento lógico do mundo. Deste modo a nossa consciência de ser passa, não pelo nosso “conteúdo” enquanto indivíduos mas, pela noção que temos da nossa própria envolvência, ou seja; do mundo. A gestão da liberdade torna-se assim um exercício de opções. Sabendo que não podemos isoladamente superar a precariedade e a fragilidade da nossa vida, optamos inconscientemente por atribuir à nossa mundivivência os motivos que nos estimulam a razão. Negamos assim, inconscientemente, a nossa existência para nos concebermos, a nós próprios, também inconscientemente, como missionários da nossa ambição.

Ainda que não esteja esclarecido se as restantes espécies animais colocam ou não a sobrevivência da espécie sobre a vida de cada indivíduo, o que parece ser verdade é que os seres humanos no geral, pelo menos na nossa civilização industrial e ocidental, dão bastante mais importância à construção de uma personalidade individual e original do que à identidade colectiva. É contudo impossível sobrevivermos à angústia da consciência do isolamento sem exercermos a nossa liberdade com sentido colectivo, ou seja; só nos superamos a nós próprios colectivamente (o que pode ser entendido como uma forma muito particular de sobrevivência da nossa espécie).

Assim, a nossa identidade individual forma-se por meio de referências. Este processo é, obviamente, cultural. E dentro do cultural ele é, essencialmente, ideológico. Quer isto dizer que estas referências são representações determinadas em função das experiências e das próprias condições de existência, por um lado. E porque essas experiências e condições são comuns a vários indivíduos, e porque temos a absoluta necessidade de nos superarmos colectivamente, as nossas identidades individuais são sempre, por outro lado e em grande medida, expressões de uma identidade colectiva. Símbolos, emblemas e mitos identitários são então referências culturais e ideológicas criadas, fomentadas, adaptadas, por indivíduos que partilham as mesmas vivências.

As homenagens são manifestações de fidelidade identitária, i.e., são provas de admiração ou veneração a que nos obrigamos a cumprir, são cultos ou reverências que ajudam a criar e alimentam estes símbolos, emblemas e mitos. Por definição a homenagem era “promessa de fidelidade que prestava ao suserano o vassalo que recebia o feudo”[1]e também “o lugar assinalado a um detido para poder andar em liberdade”[2], esta palavra evoluiu depois para menagem, que mais facilmente ligamos ao regime feudal. Por associação, somos vassalos culturais e as nossas referências os suseranos. O nosso espaço de liberdade é o nosso âmbito de criação cultural, previamente definido pelas nossas condições particulares de existência. Somos, enfim, leais, constantes, francos, sinceros e dedicados porque somos orientados a sê-lo. Ao contrário das promessas que fazemos por opção e que nem sempre cumprimos, nesta relação “feudal” estamos obrigados ao preito, ao pagamento de um tributo, ao qual nem sequer podemos querer fugir. E só traímos as nossas referências culturais quando “senhores” mais fortes vencem os nossos suseranos, quando uma “nova ordem” se impõe, aí aculturamo-nos.

As homenagens são ainda relações de dependência que dispensam vínculos legais ou barreiras temporais. Como todas as relações privilegiadas do antigo regime, baseiam-se na palavra e são seculares, legitimam-se pela honra e pelo tempo. Deste modo a nossa promessa de lealdade subsiste para além da nossa existência, dando então sentido à nossa vida: o cumprimento de um imperativo ontológico. Assim herdamos e transmitimos por herança a vassalagem cultural. Colectivamente somos um todo cultural de fronteiras móveis, tão móveis quanto são os seus elementos constitutivos.

Herdamos os homenageados dos nossos homenageados. Ou seja: as referências daqueles a quem prestamos homenagens tornam-se também nossos homenageados, i.e. nossas referências. Em suma, quando hoje fazemos uma homenagem estamos a dar corpo visível à nossa orientação cultural e ideológica, estamo-nos a afirmar e ao nosso património cultural, pois o objecto da nossa homenagem não se define a si próprio, é também fruto do seu contexto. Deste modo as nossas homenagens são manifestações de sedimentação cultural.

Ao venerarmos um símbolo prestamos reverência às suas origens, ao elegermos um herói o nosso tributo é para os seus feitos, ao criarmos um mito cultivamos aquilo que o explica, ao mostrarmos a nossa estima pela vida e a obra de um artista revelamos também fidelidade para com as suas fontes de inspiração e influências.


[1] COSTA e SAMPAIO E MELO, Dicionário da Língua Portuguesa, 1976, p. 766
[2]
Ibd.


*Vermelhices (Comentários Políticos) XII*

Cidadania e Política

Texto escrito para o Arauto, o jornal da Escola Secundária Manuel de Arriaga

Os homens chegaram a um sítio, observaram as suas condições, concluíram que era um bom sítio. Traçaram uma cruz e ao fazê-lo estavam a atribuir ordem ao espaço. A partir dela rasgaram as ruas, ergueram as casas, construíram as praças. Edificaram a cidade. Mais tarde, os homens gregos chamaram polis às suas cidades e os homens romanos civitas.

Antes da cidade os homens viviam dispersos em comunidades nómadas e em pequenos aglomerados. Viviam de maneira diferente porque as suas vidas colectivas eram muito limitadas e pouco exigentes. Ao criar a cidade, para além de dar ordem ao espaço, os homens deram uma ordem à vida; tiveram de criar novas formas de conviver, tiveram que harmonizar os seus comportamentos, apuraram as regras dos seus povoados para a nova era. A essa nova dimensão da vida pública os gregos deram o nome de política e a palavra percorreu o mundo (mesmo nos sítios onde as cidades não eram polis). À era e aos povos das polis ou civitas os romanos chamaram civilização.

Hoje muitos de nós esqueceram-se que vivemos em conjunto porque precisamos uns dos outros e que é por vivermos em conjunto que evoluímos, esqueceram-se que por necessitarmos uns dos outros precisamos de encontrar forma de todos vivermos o melhor possível; respeitando-nos, ajudando-nos mutuamente, criando as melhores condições para que vida de cada um seja a melhor possível, porque o melhor para cada um é o melhor para todos e o melhor para todos é o melhor para cada um. A cidadania e a política devem ser isto.

Mas palavras são muitas vezes como o barro, moldam-se, adaptam-se, soltam bocados, agregam outros, de tal modo que a certa altura esquecemo-nos que o pote das ameixas nasceu junto com o jarrão da sala. Por diversas razões a política passou a ser mal vista; todos reconhecem que é necessária, mas muitos vêem-na como um assunto de outros e, principalmente, de oportunistas ávidos de poder. A cidadania como não sofreu esse mau uso, é mais bem acolhida, todavia, muitas vezes fica órfã. A cidadania (tal como a política) é responsabilidade de todos; todos devemos portanto levá-la como uma dimensão fundamental nas nossas vidas.



AZULICES (Curiosidades açoreanas) XIV

Posted by Hello


Para os faialenses que virem o meu blog. Sei que vai um pouco atrasado, mas como se diz por aí: mais vale tarde do que nunca! Para quem não sabe; os Encontros Filosóficos são uma iniciativa promovida pela escola e que se realizam todos os anos, sendo esta a 12ª edição. Deve-se ao principal empenho da Maria do Céu (mas também de outros professores).


sábado, fevereiro 26, 2005

*Vermelhices (Comentários Políticos) XI*

Escreva uma pergunta
Dizia o simpático cabeçalho do Microsoft Word
Pronto para me dar uma resposta.
Também um clips animado saltava e coçava a cabeça (se é que os clips podem ter cabeça)
Piscava os olhos e mirava-me como quem diz “um criado ao seu dispor”.
Lembrei-me da Odete Santos a dizer o outro dia na TV:
“Nem criados e muito menos ao dispor”.
Escrevi felicidade
Não obtive resposta.
Obviamente: o Bill Gates não faz parte da solução. Só do problema.
Na vida não temos cabeçalhos ou clips tão prestáveis
Mas temos ainda gente de carne e osso que dá o que pode e o que não pode para solucionar os problemas da nossa vida política.
O rapaz de dezoito anos não compreendia isto.
Começou por discutir connosco com o olhar acusador
Julgando-nos culpados pela sua situação: ajudar a mãe a sustentar oito irmãos com um magro salário de operário, enquanto o pai se perde no álcool.
O nosso camarada de brilho nos olhos e que trata toda a gente por tu, um tu tão sentido que nos faz sentir imediatamente irmãos, procurou explicar-lhe que não somos todos iguais. Eu, sem vocação para clips simpático fui mais dura: não nos podes responsabilizar por competências que não nos deste e não podes afirmar coisas que não sabes. Ao fim de algum tempo todo o café discutia o assunto.
O rapaz continuava a mostrar resistência. É normal. Ninguém gosta de admitir estar errado. Não gostam de o admitir frente a uma força política que querem hostilizar. Muito menos nestas coisas que se espalham e se alojam na cabeça das pessoas como uma verdade indubitável. Um axioma: Os políticos são todos iguais.
E acima de tudo não gostam de tomar consciência que essa frase tem um outro significado escondido e mais verdadeiro: Eu sou igual à imagem que faço dos políticos.
Sai do café bem satisfeita. O camarada Luís Carlos também. Os outros nem por isso. É bom, muito bom, ter a oportunidade de discutir com as pessoas. Fica sempre alguma coisa. Pode não ter sido ganho o voto. Mas aqueles não voltarão a dizer que somos iguais aos outros. Sobretudo depois de termos afirmado que independentemente das derrotas eleitorais continuamos acreditar na nossa razão.

O clips já dorme. Eu estou acordada.

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

sábado, fevereiro 19, 2005

Cá estou eu outra vez!


cores e mais cores Posted by Hello

Bom, vim de armas e bagagens para esta nova morada.
Fui boicotada, censurada, ignorada e sei lá que mais pelo sapo.
De modo que republiquei todos os posts anteriores aqui, mantendo as mesmas datas. Os comentários é que não os trouxe (também eram pouquitos) mas podem ir lá vê-los se tiverem curiosidade (isto, se houver alguém que leia esta treta). A imagem como podem ver também mudou. Veremos que outras mudanças ocorrerão!


segunda-feira, fevereiro 14, 2005

Lembras-te Johnny F?

Uma noite no Bairro Alto.
Seguíamos (eu, tu, a SP e a Joaninha) em direcção ao Príncipe Real.
Um grupo de raparigas de 18, 19 anos, e que eram de Sines, pediu-nos ajuda para mudar um pneu ao carro.
Eram um bocado ataditas as moças…
Pusemos mãos ao trabalho (mais eu e tu. A SP e a Joaninha iam dando umas bocas).
Com as mãos já sujas, tentávamos dar uma rápida formação política às raparigas ao mesmo tempo que explicávamos como se muda um pneu.
Num rasgo de grande inspiração mataste dois coelhos com uma cajadada. Disseste enquanto apertavas as porcas das jantes: “Na vida, como nas torneiras, a direita aperta e a esquerda liberta”.
Foi um fim de noite profícuo.

Boa sorte para as eleições da ABIC!


quarta-feira, fevereiro 09, 2005

AZULICES (Curiosidades açoreanas) XIII


Moinho do Faial Posted by Hello

AZULICES (Curiosidades açoreanas) XI


Posted by Hello

Aqui percebe-se melhor como o iate é grande!!!

AZULICES (Curiosidades açoreanas) X


Posted by Hello

Segundo o boca a boca aqui pela ilha, este é o maior iate do mundo. O mastro tem mais de 100 metros de altura. Chama-se Mirabella V.

Ocupou um bom bocado da marina e até teve direito a um securita destacado para o vigiar. O que mostra bem como a propriedade privada é protegida e a pública descurada. É que há algum tempo atrás fiquei à espera de um securita, durante horas, nas instalações dos serviços da marina. Podia ter incendiado ou roubado o sítio sem que dessem por isso .

segunda-feira, fevereiro 07, 2005

Os pardais

Senta-te ao pé de mim
vamos conversar
podemos olhar para os pardais
que parecem sempre felizes

podemos falar de coisas sérias
aquelas de que não nos podemos rir
porque se rirmos
deixam de ser sérias

Podemos sonhar a dois
(os sonhos ao menos
nunca são sérios)
imaginarmos um mundo melhor
para os nossos filhos e netos

Podemos partilhar sentimentos
as angústias, as emoções,
as ansiedades, as paixões,
os interesses e as desilusões

Podemos dizer disparates
inventar letras para fado
torturas para o Paulo Portas
fazer apostas descabidas

Ou podemos ficar em silêncio
num silêncio de tranquilidade
a ver os pardais
que parecem sempre felizes.


domingo, fevereiro 06, 2005

ARTE DE TRANSFORMAR XXII

HAVEMOS DE VOLTAR

Às casas, às nossas lavras
às praias, aos nossos campos
havemos de voltar

Às nossas terras
vermelhas do café
brancas do algodão
verdes dos milheirais
havemos de voltar

Às nossas minas de diamantes
puro, cobre, de petróleo
havemos de voltar

Aos nossos rios, aos nossos lagos
às montanhas, às florestas
havemos de voltar

À frescura da mulemba
às nossas tradições
aos ritmos e às fogueiras
havemos de voltar

À marimba e ao quissange
ao nosso Carnaval
havemos de voltar

À bela pátria angolana
nossa terra, nossa mãe
havemos de voltar.

Agostinho Neto

*Vermelhices (Comentários Políticos) X*

Posted by Hello



No ano de 1961, angolanos rebelados do poder colonial português pegaram em catanas, invadiram prisões e destruíram interesses portugueses, dando início à luta armada. Mas a luta dos angolanos é uma luta antiga. Desde que os portugueses pisaram o território que é hoje Angola que os Kimbundus, e mais tarde Umbundus e Nianecas ofereceram resistência à ocupação. Uma resistência cuja história é feita de heroísmo, dignidade, inteligência, mas também de oportunismos e traições. A história de Angola é a história do mundo desde os "descobrimentos", das relações económicas que ao longo de séculos se foram estabelecendo e sedimentando, a história dos muitos milhões de seres humanos caçados e transportados como gado para o outro lado do Atlântico, aqueles que juntamente com degredados e índios construíram a América, a história dos que, com armas rudimentares impediram os portugueses, durante anos, de transpor o rio Cunene, é a história da astúcia de uma rainha que não se rebaixou aos holandeses, de sobas que defenderam Benguela com unhas e dentes, de um médico, poeta e comunista amado pelo seu povo, do comandante Hoji Ya Henda e do pioneiro Ngangula, é a história de uma independência que a direita (e a pretensa esquerda do PS) tardaram em aceitar e prontamente atacaram, é a história de uma das mais sangrentas e sofridas guerras da humanidade, de um país que por estar carregado de diamantes e petróleo não tem descanso, é também a história das estórias de belas mulheres, homens valentes, de danças, de embondeiros, de palancas, de welwitschias mirabilis, de marimbas e jacarés. É uma história que não se conta porque não convém, porque se transmitiu por tradição oral e não existem antropólogos, arqueólogos e historiadores com interesse ou meios para a escrever, porque está a apodrecer no arquivo histórico ultramarino, porque o seu povo ainda é maioritariamente analfabeto (58%).

sexta-feira, fevereiro 04, 2005

*Vermelhices (Comentários Políticos) IX*

Posted by Hello


Hino Nacional de Angola

Oh Pátria, nunca mais esqueceremos
os heróis do 4 de Fevereiro
Oh Pátria, nós saudamos os teus filhos
tombados pela nossa independência
Honramos o passado e a nossa história
construindo no trabalho o homem novo
Honramos o passado e a nossa história
construindo no trabalho o homem novo

Angola, avante!
Revolução, pelo poder popular
Pátria unida, liberdade
um só povo, uma nação.

Levantemos nossas vozes libertadas
para glória dos povos africanos
marchemos combatentes angolanos
solidários com os povos oprimidos

Orgulhosos lutaremos pela Paz
com as forças progressistas do Mundo
Orgulhosos lutaremos pela Paz
com as forças progressistas do mundo


quarta-feira, fevereiro 02, 2005

ARTE DE TRANSFORMAR XXI - Ainda a república

Liberdade Guiando o povo Posted by Hello


Iconografia da república ou as mamas de Mariana

Sobre o barrete frígio pouco há a dizer; ele é o mais frequente ícone da república, é um símbolo que teve origem na antiga Roma, identificando os escravos libertos por aforria. Costumava aparecer nas representações da liberdade. Teria surgido originalmente numa moeda cunhada em Roma, com o dístico Republica Liberata e foi depois amplamente difundido com a Revolução Francesa.
Do mesmo modo também os seios se tornaram atributos da república, embora com origem mais recente. João Medina refere que em 1830, depois de uma primeira representação mais idealizada (por alturas da revolução) e de uma segunda mais varonil (do tempo da I República francesa) seguiu-se uma terceira, nascida nas barricadas, e celebrizada por Delacroix no famoso quadro “Liberdade guiando o povo” (acima), que
“passou a ser, de modo inequívoco e acentuado uma mulher com seios: seios planturosos, vigorosos, seios ostensivos geralmente nus ou amplamente decotados de maneira a serem generosamente oferecidos aos olhos e à libido dos seus sequazes-admiradores-fanáticos(...)
Uma vez triunfante com a III República, Mariana sobe aos altares das «mairies» e das perfeituras, é cultuada nos nichos dos templos burocráticos, preside a tribunais e repartições públicas, reina sobre o seu povo: mas é sempre a Mulher dos Seios nus ou, pelo menos opulentos, prometidos, entremostrados ou calmamente derramados do decote onde a feminilidade e as glândulas mamárias se escondem ou recatam. Os seios funcionam doravante como o barrete frígio, definem-na essencialmente: ela é a Mulher com Seios, isto é, a Amante ou a Mãe que se oferece à fome dos seus, a protectora dos esfomeados, a ama dos deserdados, a Virgem-Mãe que, de certo modo, substitui a Virgem Maria nos altares populares. (...) os seios que a República oferece ao povo republicano são, multiplicados por dois, aquele seio maternal que, nos altares a Virgem Mãe dá ao Menino Jesus, ele mesmo símbolo da Humanidade carente, frágil, e necessitada” . Roque Gameiro estaria bem ciente desta representação da república, tanto que mais tarde seria o autor de uma litografia (de 1909 ou 10) [ver imagem do post sobre o 31 de Janeiro de 1891 – Vermelhices VII] em que “o lado «mamalhudo» da república nunca foi escamoteado, antes pelo contrário, exagerou-se o volume mamário a ponto de provocar alguma chacota, a começar pela expressão patriotismo como sinónimo popular de ostentação de seios planturosos” .
João Medina apresenta ainda de um modo esclarecedor, a visão burguesa que Gameiro teria da república:
“na sua configuração seria possível detectar uma certa dualidade da imagem que entre nós representou -, na prática, foi – a revolução portuguesa. A litografia de Roque Gameiro mostra-nos, sobre um horizonte imenso de centena e meia de reconhecíveis figuras cimeiras do Partido Republicano Português – em vésperas do 5 de Outubro, julgamo-lo -, pairando, sobre esta prole imensa de homens (...), a República Mãe, de opulentos seios: é o Povo republicano reunido, unânime e compacto em torno, e à sombra tutelar, da República portuguesa, da Mulher-Liberdade, cujo advento se espera com fervoroso messianismo, de cunho provavelmente mariânico (...) esta mulher, posta ao centro e acima do seu povo, tem a compostura e o classicismo da primitiva imagem da República de inspiração romana: é a deusa tutelar casta e forte, sem dúvida de peito descoberto, mas de túnica intacta, serena na atitude, duma grande gravidade na verticalidade como que imóvel do seu corpo. Corpo de Mulher-Deusa e não de revoltosa em cima de barricadas. Até a espada que segura e levanta com a mão direita tem um aspecto sereno. (...) não há aqui barricadas nem homens em fúria. Estas 161 figuras que Roque Gameiro, com imensa paciência, desenhou em torno da Mulher-Liberdade são burgueses bem vestidos ou fardados, gente séria, um tanto grave com ar de quem espera que o triunfo da sua causa venha por vias pacíficas e não pela força das armas. (...) nada deve à mulher do povo que Delacroix pôs em cima das barricadas, no meio de homens que combatem e gritam, morrem ou jazem feridos, no meio de destroços e isto apesar de sabermos que o 5 de Outubro triunfou após combates cruentos numa cidade riscada pela fuzilaria das armas, abalada pelo estampido dos canhões dos barcos revoltosos surtos no Tejo e do explodir dos petardos da «artilharia civil» (...). E não obstante ter vencido no meio do fogo, do sofrimento, da incerteza, da angústia e do sangue, esta revolução era precedida duma lenda de pacifismo e legalismo que sabemos inteiramente falsa, à luz do que se passou no congresso do partido reunido em Setúbal em Abril de 1909, e donde saiu um directório encarregado «por a Revolução na rua», custasse o que custasse ou seja, com evidente consciência de que a realeza só havia de baquear pela força das armas” .
Em algumas representações da república portuguesa também se encontram ramos de oliveira, que, embora não façam parte da normal da sua iconografia, a ela estão associados, representam a paz (em que cujas figuras femininas alegóricas aparecem sempre cingindo as têmporas. O ramo de oliveira associado à pomba branca – Espírito Santo – é também um antigo símbolo cristão evocativo da paz, retomado no século XX por Picasso que o difundiu, sendo depois adoptado por organizações progressistas).
A estrela de cinco pontas aparece isolada, sobre o barrete frígio ou sobre a testa da figura. É o ícone com maior número de significações simbólicas. Muitas delas são marciais. Também surge como símbolo do internacionalismo proletário (cada uma das pontas representará um dos continentes). Mas as representações das estrelas de cinco pontas sobre a testa, e mais frequentemente a de seis pontas, ou hexalfa, aludem a cultos do sol, e, estranhamente, em grande medida o culto do sol lembra o absolutismo e a monarquia. Nas representações portuguesas ela aparece invertida: os símbolos invertidos têm conotações vulgares com o mal. No caso da estrela pentagonal passa-se o mesmo, mas nessa situação costuma ser representada com os vértices unidos e inscrita num pentágono, formando o pentagrama Não é o caso. E também não me parece que de algum modo possa aludir ao mal. Mas também se sabe que a carbonária utilizava um triângulo idêntico ao da maçonaria mas invertido, e que tinha por símbolo uma estrela de cinco pontas. É pois plausível considerar que a maçonaria fizesse o mesmo, isto é, que invertesse o símbolo carbonário e se apropriasse dele.
O feixe de lictores é, do mesmo modo, um dos símbolos da república. São molhos de varas de trigo e eram usados na antiga Roma como símbolos de poder. O imperador, por exemplo, correspondia a 24 feixes, o cônsul a 12, o pretor a 6, o edil a 2. O Fascismo italiano adopta esse símbolo (donde, aliás, deriva o seu nome), no entanto para o republicanismo ele deve andar sempre associado ao barrete frígio significando a tomada de poder (lictores) pelos escravos (barretes). E apesar do uso fascista dos lictores ter gerado o abandono da sua representação por parte de muitas instituições republicanas, ela continua pontualmente a ser usada (por exemplo, no selo da República de Cuba).