segunda-feira, janeiro 31, 2005

*Vermelhices (Comentários Políticos) VII*


Posted by Hello

O 31 de Janeiro de 1891

Muitos historiadores consideram que o republicanismo em Portugal morreu com o 5 de Outubro de 1910. O Partido Republicano vinha reunindo desde 1905 todo o tipo de opositores à ditadura de João Franco; republicanos liberais, republicanos socialistas, monárquicos liberais regeneradores e conservadores, entre outros. O partido descaracterizou-se e em 1911 até mudou de nome (de Partido Republicano Português para Partido Republicano) tornando-se um verdadeiro saco de gatos e plataforma para todo o tipo de oportunistas que visavam o poder. A primeira república foi uma verdadeira frustração para todos os que acreditavam na mudança. A título de exemplo refira-se que a constituição de 1911 não adianta uma linha sobre a estrutura económica do país. Assim, Portugal manteve-se um país dependente com uma economia agrícola (ainda com muitos traços feudais) e uma tímida indústria. O desenvolvimento capitalista não se deu e os maiores progressos registados foram na educação e na laicização do Estado (com a importante passagem das competências de registo e recenseamento da igreja para o estado). Esta laicização foi de tal forma abrupta (tendo em conta que Portugal tinha sido um país rigidamente católico, com uma população analfabeta que nunca tinha assimilado sequer os ideais do iluminismo), a partir de 1914, o clericalismo, vitimando-se e aproveitando a situação de crise e do pavor da guerra (os soldados começaram a exigir padres nas frentes) ganha terreno. Criam-se assim as condições para o conservadorismo e o fanatismo religioso (cuja principal manifestação é a ilusão colectiva de Fátima). E cresce então o integralismo lusitano de Sidónio Pais (ideologia de extrema-direita) que inspirará o Estado Novo.

Mas antes, muito antes, o republicanismo era a ideologia que inspirava os filhos das revoluções e revoltas como as do setembrismo, da Maria da Fonte e da patuleia, daqueles que acompanharam os acontecimentos de 1848 e 1871 em França; a chamada geração de setenta, que incluía o precursor do socialismo em Portugal (Antero de Quental). E essa geração andava aliada com os primeiros movimentos de assalariados agrícolas e operários industriais (também eles criadas à imagem das antigas trade unions). Um movimento pouco consolidado, como diria, mais tarde, Bento Gonçalves, mas, ainda assim, existente. Um movimento que na consequência de uma grave crise social, económica e política e com a “gota de água” do ultimatum inglês provoca, na cidade do Porto, uma primeira tentativa de implantação da república – essa sim faria juz ao barrete frígio, ao feixe de lictores e à Marianne de peito desnudado. No entanto, como disse Lenine, Portugal é o país das revoluções inacabadas.
Mas se a revolução liberal trouxe a monarquia constitucional, o 5 de Outubro o liberalismo, o 25 de Abril o capitalismo, da próxima vez chegaremos ao socialismo.
A história demonstra que os movimentos de libertação têm avanços e recuos, e para desmontar a teoria dos profetas do fim da história há que contá-la!

A Portugueza, hoje hino nacional, era uma das canções dos revolucionários do 31 de Janeiro e inclui um conjunto de estrofes que hoje não se cantam, mas que são, em minha opinião, as mais bonitas (e reparem na actualidade):

Saudai o Sol que desponta
Sobre um ridente porvir;
Seja o eco de uma afronta
O sinal de ressurgir.

Raios dessa aurora forte
São como beijos de mãe,
Que nos guardam, nos sustêm,
Contra as injúrias da sorte.
Às armas, às armas!
Sobre a terra, sobre o mar,
Às armas, às armas!
Pela Pátria lutar
Contra os canhões marchar, marchar!

Antero de Quental suicidou-se a 11 de Setembro desse mesmo ano de 1891. Certamente porque, entre outras razões, a revolução fracassara.

A um poeta

Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares,
Como um levita à sombra dos altares,
Longe da luta e do fragor terreno,

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno,
Afugentou as larvas tumulares...
Para surgir do seio desses mares,
Um mundo novo espera só um aceno...

Escuta! é a grande voz das multidões!
São teus irmãos, que se erguem! são canções...
Mas de guerra... e são vozes de rebate!

Ergue-te pois, soldado do Futuro,
E dos raios de luz do sonho puro,
Sonhador, fazei espada de combate!

Antero de Quental

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